sexta-feira, 18 de maio de 2012

OYÀ MESAN ÒRUN

O número 9, ligado a Oyá, está na origem de seu nome Iansã e encontramos esta referência no ex-Daomé, onde o culto de Oyá é feito em Porto Novo sob o nome de Avsan, no bairro Akron (Lokoro dos Iorubas) e sob o de Absan, mais ao norte em Baningbe. Esses nomes teriam por origem a expressão Aborimsan (com nove cabeças), alusão aos supostos nove braços do delta do Níger.
O culto de Oyá não se limita aos mortos, Oyá antes de tudo é um Òrìṣà das águas, como Òsun, Yemonjá, Nàná e etc., ela é um Òrìṣà da vida. Oyá tem seu culto relacionado ao rio Níger, mas ela pode e deve ser cultuada nas águas de um rio, independente de qualquer coisa. O que muda é a representação das águas dos rios.

Os rios dentro do culto de Oyá representam caminhos seguros, caminhos que nos levam ao fim devido, são as águas que nos guiam. Por esta razão é que Oyá é chamada de a Mãe que guia, é ela quem guia os mortos para um das nove dimensões do universo. Foi essa a incumbência que ela recebeu de Òlodúmarè, guiar os mortos de acordo com suas ações para um dos nove céus, para assumir tal cargo Oyá recebeu do feiticeiro Òsóòsi uma espécie de erukere especial chamado de Erusin com o qual estaria protegida no trato com os Eguns

 Orí o! Orí Oyá, mo gbe de.
Oyá mesan, mesan, mesan.
Oyá oriri, o o o.
Oyá mesan, a ji l'oda òrìṣà.
Ori o, ori ol' Oyá, mo gbe de.
Orí mi!
Orí Oyá, mo gbe de.

O Orí do iniciado,
O Orí daquele que é iniciado em Oyá está aqui.
Oyá, que se desdobra em nove partes.
Oyá, a grande mulher, charmosa e elegante.
Oyá, que se desdobra em nove partes.
Òrìṣà que usa a espada ao acordar.
O Orí do iniciado, o Orí daquele que é iniciado em Oyá está aqui.
Meu Orí.
“O Orí daquele que é iniciado em Oyá está aqui.”

Transcrevemos acima orin (cantiga) de Oyá, citado pelo Prof. Sikiru Salami em seu livro "A mitologia dos Òrìṣà africanos". Nesta cantiga está presente a associação entre Oyá e Orí. Esta associação nós encontramos, com grande frequência, em muitos Oríkì (saudações) e Adura (rezas) do ebora Oyá.

Ela é chamada muitas vezes de: Oyá, a tun ori eni ti ko sunwon se,

Ou seja: Oyá, aquela que melhora o mau Orí.

Diz-se também: Mo b' Oyá wa. Mo m' ase Oyá b'ori. Orí mi gba 're,

Significando: Estou com Oyá. Estou com o Aşẹ de Oyá em meu Orí. Meu Orí recebeu sorte.
 
Entre os ebora femininos, Oyá é a que mais próxima se encontra do homem, refletindo suas angústias, representando sua relação com a vida e a morte, traduzindo o encontro entre o homem e a mulher, a paixão e a força vital neste encontro presentes.

Tendo, fora de qualquer dúvida, sua natureza divina assegurada, Oyá divide com Şàngó a natureza humana deste ebora, compartilhando seus projetos, associando-se a ele em suas batalhas e unindo-se de tal forma a sua figura que se pode dizer,

Oro ti Şàngó ba so,
Oyá lo ma tumoo re.
Eyin o mo pe Oyá lo maa gbo,
Oro ti Şàngó so ku.
Oro ti Şàngó fe so,
Oyá lo maa so.

O que Şàngó disser,
Oyá vai interpretar.
Vocês não sabem que Oyá vai entender o que Şàngó nem acabou de dizer?
O que ele quiser dizer,
Oyá é quem dirá. 

Enquanto Oyá está associada ao relâmpago, Şàngó está associado ao trovão, formando, desta forma uma união simbólica entre os elementos masculinos e femininos, coparticipantes do processo de criação da vida e, na sua comunhão, certeza da continuidade dessa vida. Pares que, ao mesmo tempo em que se associa se representam mutuamente, contendo cada um o elemento presente no outro.

Esta representação é tão marcante que podemos mesmo dizer que Oyá é o aspecto feminino de Şàngó, ou ainda, que Şàngó é o aspecto masculino de Oyá, denotando, desta forma a íntima relação e funcionalidade entre os gêneros, garantia da geração da vida e de sua perpetuação na criação - Òrun e ayè, íntima e indissociavelmente ligados dentro do projeto de Òlodúmarè.
De um lado a vida, de outro a morte - ciclo que se repete indefinidamente no "sempre aqui e agora" do universo.
Segundo Juana Elbein dos Santos, em seu livro "Os Nagô e a Morte", ÒYA "... está associada a um aspecto do ar, ao vento e particularmente à tempestade e ao relâmpago (ar mais movimento = fogo); e está associada aos ancestrais masculinos que ela dirige e maneja..."

Um Itan do Òdú Òsa méjì, relatando sobre os sacrifícios feitos por Oyá para ter crianças, diz que:

" eles pegaram a carne de ovelha e fizeram remédio para ela. E ela comeu. Quando ela deu à luz, ela deu à luz nove crianças. Ela é "a mãe que teve nove". E isso é como Oyá tornou-se Iansã, "a mãe dos nove". A carne de ovelha que ela comeu como prescrição para ter crianças nunca mais tocou seus lábios novamente. Isso é porque Oyá não come ovelhas e esse animal é èwò (tabu) para os seus adoradores..."

Pela sua relação com Eegun e o mundo dos mortos nos é possível entender o papel de Oyá nos rituais de passagem que marcam a integração entre vida e morte. A yalòrìsá Stella de Osoosi, em seu livro "Meu tempo é agora", relata um mito de Oyá que nos dá a
dimensão da relação do ebora com as cerimônias fúnebres dentro da esin Òrìṣà e que resumimos a seguir.

“Oduleke, chefe de uma linhagem ilustre de caçadores e pai ancestral de todos os Odes, era casado com Osun e tomou uma criança para criar”. Esta criança, esperta e alegre, tornou-se a preferida de seu pai adotivo e recebeu o nome de Oyá. A criança cresceu e tornou-se uma jovem que apreendeu com os pais as artes da caça e os segredos da magia.

Um dia, velho e alquebrado, Oduleke é levado pela morte. Oyá, entristecida, resolve fazer uma homenagem ao pai. Para tanto, reuniu os pertences de caça de Oduleke enrolando-os em um pano por ela bordado. Preparou as comidas prediletas de Oduleke e convidou todos os chefes caçadores para a cerimônia fúnebre.

Cantando e dançando, durante sete dias carregou na cabeça o "carrego" com pertences de caça do pai. Sua voz foi levada aos quatro cantos do mundo pelo vento, seu elemento mágico, e de todos os lugares se apresentaram multidões de caçadores. Ao fim da sétima noite, Oyá acompanhada por todos os Ode foi depositar o "carrego" ao pé de uma árvore sagrada situada dentro da mata. O pássaro agbe, de penas azuis e brilhantes, deixou o galho da árvore voando para o firmamento.
 
Oduleke em Òrìṣà e Oyá na mãe dos espaços sagrados.” Desta forma estava criado o ajeje - vigília do caçador (chamado no Brasil de asese), ritual fúnebre dentro da religião do Òrìṣà.

Oyá está intimamente associada ao vento, então, podemos entender que ela exerce papel essencial no processo de fertilização do reino vegetal, através da polinização, transporte do pólen de uma planta para outra, permitindo sua fecundação e a sua multiplicação. Da mesma forma, transporta sementes, permitindo que o reino dos ebora Odé tenha garantida sua existência e continuidade.

Essa hipótese, sem dúvida, merece estudo e trabalho específico, capaz de nos permitir ampliar a perspectiva com que cultuamos o ebora Oyá e possivelmente, encontrá-la em toda a sua grandeza e dimensão.

Um Itan do Òdú Ogbè méjì relata que Èşú, querendo castigar uma ave que não fizera os sacrifícios prescritos por Ifá, lançou mão de Oyá para ajudá-lo... Então adaba foi para o topo de outra árvore e colocou ovos lá.
Aqueles que ela colocou e os fazendeiros não podiam vê-los;
 
Èşú disse, 'Você Oyá, você os viu? '
E Oyá balançou a árvore e os ovos de abada caíram no chão...
Èépàà heyi!

Oyá é saudada com a frase èépàà heyi! Onde "èépàà" representa uma recomendação de calma, expressando quase terror diante de um poder incontrolável para o homem e "heyi" é a reprodução do brado gutural emitido por Oyá quando, incorporada em seus filhos, identifica-se aos presentes.

Novamente é num verso de Ifá que podemos encontrar e origem deste brado.
A descrição da origem do grito contida no oráculo apresenta-o como reflexo da violenta ameaça da deusa, em decorrência da negligência dos homens, de destruir o mundo e não apenas torná-lo seco e estéril como pretendeu Òsun.

Flechas-de-caça-colocam-o-caçador-em-dúvida
Chuva-torrencial-dispersa-o-mercado-do-rei-de-Ifá
Estes são os nomes dos sacerdotes que Consultaram Ifá para Olúgbìjì,
uma pessoa de bem quando o encontraram em meio à rebelião.
Há um Òrìṣà, disseram os adivinhos, na sua família – Òrìṣà Dona-do-fogo.
Oh, disse Olúgbìjì, essa é Oyá.
Ela tem estado na família há muito, muito tempo.
Então você deve oferecer a ela, disseram eles, Duzentas porções de inhame amassado, uma sopa de gbegiri, uma cabra branca, seis galos e 21 pedras.
Oyá aceitou a oferenda.
Ela se preparou.
As pessoas suplicaram:
Oyá dakun (Oyá, nós lhe imploramos!)
Mas Oyá não atendeu porque estava decidida a destruir completamente os inimigos de Olúgbìjì.
E dizer Oyá dakun! de nada adiantava.
Eles não a demoveram.
Se você continuar com isso, Oyá, disseram as pessoas,
Você destruirá o mundo inteiro.
Você tem que aprender a aceitar um pedido.
Vá comprar um escravo, Oyá, eles disseram.
Um escravo saberá como respeitá-la.
Ele conhecerá todas as suas proibições
E ensinará as pessoas quando se arriscam a ofendê-la.
Ele fará seu nome cada vez mais conhecido.
O nome deste escravo era Ehin (dente)
Que nome esquisito! Disse Oyá.

Deve ser Heyi, ela bradou.
Depois disso, sempre que Oyá se enfurece as pessoas chamam Heyi,
Que é o que a pessoa possuída por Oyá chamada Heyi!
Mas a pessoa possuída não chama, não sabe!
É a própria Oyá que está chamando.

Agradecimento ao irmão 
Bàbàláwo Ifálola Agboola
Bons conhecimentos sendo compartilhado